MULHERES DA REFORMA
Árgula de Grumbach
Quando
completou 10 anos, em 1502, seu pai presenteou-a com uma Bíblia. Era mulher;
sabia ler e escrever. Não leu o livro, por ordem de seu confessor. Havia o
temor de que pensasse “bobagens”. Na época havia muitos que estavam a se desencaminhar.
Jovem ainda, Árgula de Stauff vem a ser dama de companhia da duquesa Kunigunde,
em Munique, mulher de muita oração. Em 1509, seus pais morrem, vitimados pela
peste. Por volta de 1516, casa-se com nobre da Francônia, Frederico de
Grumbach.
A
localidade é pequena, mas Árgula não está isolada do mundo. Espalatino,
secretário de Frederico da Saxônia, protetor e amigo de Lutero, envia-lhe
relação de todas as obras alemãs do reformador. Speratus, autor do hino Chegou a nós a salvação (HPD 156), faz chegar,
em 1522, carta de Árgula às mãos de Lutero. Entrementes, Árgula releu tantas
vezes a Bíblia dada pelo pai que se torna grande conhecedora de seu texto e viu
a verdadeira luz brilhar. Da Bíblia
lhe vem tal certeza de fé que afirma que, mesmo que Lutero negasse suas
convicções, ela não o faria, pois não me
baseio em sua, minha ou outra razão, mas na verdadeira rocha, Cristo. Suas
posições estão baseadas na convicção adquirida na leitura da Bíblia e logo se
manifestarão em público.
Seu
irmão Marcelo, estudante em Ingolstadt, informa-a sobre tendências presentes na
Universidade. Os duques bávaros publicam, em 1522, edito contra novas correntes
religiosas, mas os estudantes liam Erasmo e as idéias de Wittenberg se faziam
presentes. Um franciscano afirmava que a ceia devia ser recebida sob ambas as
espécies, o professor de grego, João Agrícola, correspondia com o pregador
Osiander, em Nürnberg. Em
1523, o Arsácio Seehofer, ex-aluno de Melanchthon, se confessa culpado de haver
lido as cartas de Paulo, sob a orientação de Meleanchthon e de Atanásio
(295-373)!! Sob tortura, nega suas convicções e é aprisionado em um mosteiro
bávaro. Árgula chora. Tudo está a acontecer próximo a ela. Os homens, que
defendem as mesmas convicções de Arsácio, silenciam. Ela, então, escreve carta
ao Reitor e aos professores de Ingolstadt, cita Mateus 10.32 e Lucas 9.26 e,
baseando-se na autoridade de seu batismo, pergunta: Mostrai-me, senhores professores, onde se encontra na Bíblia, que
Cristo ou seus apóstolos tenham encarcerado, queimado ou assassinado ou banido
alguém... Não vos escrevi lero-lero de mulher, mas a Palavra de Deus, como
membro da Igreja cristã, ante a qual as portas do inferno não prevalecerão.
No mesmo dia, envia carta ao duque Guilherme, em Munique. Sua carta à
Universidade foi impressa e divulgada. O chanceler da Universidade oficia ao
esposo de Árgula, mandando que cale a boca, pois segundo prática cristã é
proibido às mulheres ensinar na Igreja. Espalham-se boatos. Um pregador
refere-se a Árgula como “cadela herética” que segue o espírito de Lutero. Um
primo sugere a seu marido, após este haver perdido seus cargos, que ela seja
emparedada. Ela responde que já está a sofrer o bastante sob sua tutela, mas
que isso não a afastará da fé de seus pais. Gente simples a defende, os
professores universitários a atacam. Por fim, Lutero também intervém, pois todos os porcos bávaros passaram a
freqüentar a escola de Ingolstadt e lá se tornaram mestres e professores da
Universidade.
Anos
depois, Arsácio foge do mosteiro e se torna pregador em Württemberg. Os
parentes de Árgula mudam de opinião, alguns se tornam luteranos. Ainda assim,
ela não se cansa de escrever. Exerce o Sacerdócio
de todos os crentes. Sua própria situação não melhora. Ainda em 1528,
Lutero envia carta de Árgula a Espalatino, na qual relata toda a sua dor. Nos
anos em que as primeiros fogueiras queimam simpatizantes da Reforma, Árgula
está a educar seus filhos. Em 1530, durante a dieta de Augsburgo, visita Lutero
na fortaleza de Corburgo. Neste mesmo ano, faleceu seu esposo. Tornou a casar,
mas o segundo esposo, evangélico, falece em pouco tempo. Em 1563 é presa pela
segunda vez sob a acusação de haver levado pessoas a abandonar a antiga fé.
Tem, então, 70 anos. Sai, ainda, da prisão e falece cinco anos mais tarde, em
1568. Não sabemos onde foi sepultada. Só podemos mirar-lhe a fé.
Autoria: Martim N. Dreher
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