sexta-feira, 28 de março de 2014

QUARTO BLOCO

NA CONSTRUÇÃO DE HERMENÊUTICA
E METODOLOGIA FEMINISTAS LUTERANAS

 por Ivoni Richter Reimer

Com base na apresentação 
no Encontro de Red de Luteranas 
São Leopoldo – 2013


“Ler significa reler e compreender; cada um lê com os olhos que tem e interpreta a partir de onde os pés pisam” (BOFF, 1997)


ROMANTISMO
Continua-se a tecer reação contrária ao radical peso colocado na razão e na objetividade do Humanismo/Iluminismo. Destaca-se a subjetividade e o indivíduo, a estética e o idealismo (final do século XVIII ao final do século XIX) na construção do conhecimento. Na Teologia desenvolve-se o método exegético histórico-crítico. Na história da hermenêutica, o alemão Friedrich Schleiermacher (1768-1834) ficou conhecido como ‘pai’ da hermenêutica, atuando como professor de teologia e filosofia em Halle. Era teólogo protestante moraviano-pietista, pastor em Berlim. Afirmava ser importante fundamentar teoricamente os processos interpretativos e não apenas as regras de interpretação em campos específicos (exegese, método...). Para tal, era preciso perscrutar as condições da interpretação: importância do sujeito com espírito criador, não compreendido sob os desígnios do juízo universal; considerar o real e o cotidiano. Assim, ele desenvolve uma teoria hermenêutica com duas dimensões importantes: a) histórico-gramatical e psicológica (comunhão entre o espírito do leitor e do autor = congenialidade), que passa a servir de indício para as reflexões em torno da intenctio auctoris e da intenctio lectoris.

O filósofo hermeneuta, historiador, psicólogo e pedagogo alemão Wilhelm Dilthey (1833-1911) vivencia influências de F.Schleiermacher e influenciará G.Gadamer com suas elaborações acerca da hermenêutica. Estudou em Berlim e, após várias docências em outras cidades, terminou sua vida como professor em Berlim. Afirmava que as expressões da nossa compreensão comum eram os sinais, os símbolos, a fala e a escrita. Para se compreender um escritor/autor ou um texto, tido por ele como ‘o outro’, é necessário interpretar por meio de um reviver (Nacherleben) que tem por base a empatia (Hineinversetzen). Diferente do ‘espírito’ de sua época, contudo, afirma que a compreensão acontece na atividade social da leitura e não na solidão do indivíduo, e esta atividade requer a força da imaginação (transportar-se para a mente do outro).

Nesse mesmo tempo, no outro lado do mundo, Elisabeth Cady Stanton (1815-1902), participava de movimentos sociais abolicionista e sufragista, lutando pela abolição da escravidão nos EUA e pelo direito das mulheres ao voto. Numa viagem a Londres, onde ela fora convidada a participar de um congresso internacional, ela foi proibida de falar em público por um reverendo que conclamou as palavras bíblicas: “Que a mulher permaneça calada na assembleia e que em tudo seja submissa”... Voltando aos EUA, ela começou a estudar Teologia, as línguas originais bíblicas, empenhou-se a fazer exegese com o novo método histórico-crítico, e junto com seu grupo de estudos, formado por mulheres e alguns homens, passaram a afirmar que a bíblia não é um livro neutro e não foi ‘ditada’ por Deus, mas foi escrita por homens dentro de um mundo dominado por eles. Denunciaram que a interpretação de textos e a construção de dogmas estão perpassados por interesses de dominar principalmente mulheres e escravos. Afirmaram que a leitura da Bíblia deve ser grupal e estar embricada nos movimentos sociais. Traduziram a Bíblia para inglês e escreveram comentários dos textos que apresentavam mulheres. Assim, em 1895 e 1898 foi publicada, em duas partes, a primeira Bíblia da Mulher, em perspectiva crítico-feminista. Acusada pela hierarquia da igreja de que esta seria uma “obra de Satanás”, ela e seu grupo negaram isto veementemente, retrucando que não poderia se-lo, pois ele (Satanás) estava muito ocupado participando de concílios e outros conclaves eclesiásticos... A Bíblia da Mulher teve várias edições e foi marco fundamental para a construção de teologias feministas.

Síntese do romantismo
Destaca-se a importância da subjetividade e a experiência histórica contextualizada para a interpretação de textos. Desenvolve-se o método exegético histórico-gramatical e histórico-crítico. Por meio do revisitar autores do passado, constrói-se a teoria da congenialidade para descobrir a intenctio auctoris. Afirma-se a importância do grupo para estudo da Bíblia, emergindo as primeiras experiências de hermenêutica feminista a partir de movimentos sociais e de conflitos com representantes da hierarquia eclesiástica. 


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