Mulheres na Reforma
por Ruthild Brakemeier
“Nenhuma Reforma sem o apoio das
mulheres” – Essa afirmação do historiador Martin H. Jung pode parecer
exagerada, mas, quanto mais a pesquisa histórica avança, contemplando também as
mulheres, mais ela convence.
As poucas mulheres que aqui podemos
mencionar mostram o quanto foram importantes na divulgação da teologia da
Reforma. Elas deram um testemunho corajoso, não só porque leram escritos de
Martim Lutero e outros reformadores, mas também a própria Bíblia.
Um exemplo é Árgula von Grumbach,
que, aos 10 anos de idade, recebeu de seu pai uma Bíblia alemã. Isso foi em
1502, e Martim Lutero ainda não havia traduzido a Bíblia para o dialeto que se
tornou a língua oficial na Alemanha. Mas já havia traduções para outros
dialetos.
Árgula lia com muita dedicação sua
Bíblia. Assim pôde argumentar a partir dela ao escrever uma carta aos
professores da Universidade de Ingolstadt para defender um jovem professor que
fora expulso por transmitir doutrinas de Filipe Melanchthon.
No início da carta, ela citava
Mateus 10.32: “Todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o
confessarei diante de meu Pai, que está nos céus”. Para ela, não havia dúvida
de que também as mulheres estavam aqui incluídas. Em sua carta, propôs um
diálogo com os professores, príncipes governantes e quem quisesse participar,
pedindo que justificassem com argumentos bíblicos a condenação do jovem
professor.
Ciente de que os professores não se
sentiriam livres para discutir com uma mulher, lembrava aos professores na
carta que também Jesus falara com mulheres. Ousada, escreveu: “Caso acontecesse
que Lutero se retratasse, o que Deus queira impedir, isso não me deverá afetar.
Pois não me firmo na sua, nem na minha inteligência, nem na de outra pessoa,
mas unicamente na rocha verdadeira, o próprio Cristo”.
Os professores não lhe responderam.
Mas a sua carta foi impressa pelos adeptos da Reforma. Em dois meses, ela foi
editada treze vezes. Na capa do folheto encontrava-se uma figura mostrando como
ela, sozinha, enfrentara um grande número de pessoas eruditas, com o dedo nas
Sagradas Escrituras.
A carta aos professores não foi a
única publicação de Árgula. Em 1523 e 1524, foram editados mais sete de seus
escritos, alcançando um total de 30.000 exemplares.
O perigo de ser mulher – Quem se manifestava a favor das ideias da Reforma corria o risco de ser
punido por autoridades eclesiásticas e civis, visto que Estado e Igreja
formavam uma unidade. Era até proibido ler escritos dos reformadores. Se isso
já valia para os homens, muito mais para as mulheres.
Jesus havia rompido com conceitos
que discriminavam e desvalorizavam a mulher. Porém eram fortes demais certas
concepções, como as do filósofo Aristóteles, que havia afirmado: “A mulher é o
homem incompleto, um ser passivo e receptor, cuja única função é a reprodução”.
A isso se acrescentava a crendice de que a mulher é facilmente dominada pelo
diabo.
Um resultado foi a perseguição às
bruxas, que ganhou força depois que a prática foi reconhecida por uma bula
papal em 1484. Acredita-se que, durante aproximadamente 200 anos, o total de
mulheres mortas, acusadas de bruxaria, chegou a um milhão. A maioria delas foi
torturada e queimada viva em praça pública.
A libertação da mulher pela Reforma
– A teologia da Reforma protestante deu mais uma vez às
mulheres a possibilidade de se sentir livres para manifestar-se em público.
Lutero acentuava o “sacerdócio geral de todos os crentes” e recomendava a
leitura da Bíblia. Mulheres como Árgula von Grumbach, Catarina Zell e muitas
outras liam a Bíblia e os escritos de Lutero sentindo-se aliviadas e
encorajadas a manifestar-se também.
Catarina Zell, casada com o
sacerdote de Estrasburgo, que com ela aderiu ao movimento da Reforma, expressou
esse alívio assim: “Senti-me como se alguém me puxasse da terra, do inferno
atroz e amargo para o lindo e doce reino dos céus”. Uma passagem bíblica que
lhes dava força era Joel 2.28, citado no livro de Atos 2.17, onde o profeta diz
que chegará o dia em que também as filhas receberão o Espírito de Deus e
profetizarão.
Catarina Zell viveu concretamente a
sua fé. Na hora do sepultamento de seu marido, sentiu-se motivada a pregar.
Vendo que isso gerou polêmica, justificou-se escrevendo que não pretendia o
ministério do pregador ou do apóstolo. Mas, “assim como a querida Maria
Madalena, sem intenção premeditada, tornou-se uma apóstola, por ter sido
impelida pelo próprio Senhor a comunicar aos discípulos que Cristo ressuscitou,
assim eu fiz”.
RUTHILD
BRAKEMEIER é diaconisa em São Leopoldo (RS), Brasil.
FONTE: Revista NOVOLHAR - Ano 11- Edição 53
Setembro e outubro de 2013
São Leopoldo-RS
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